Uenp exclui aluna autodeclarada indígena após confirmar que ela não pertence a nenhuma etnia
Uma aluna da Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP) foi excluída da instituição após processo administrativo disciplinar concluir que ela não é indígena.
A estudante ingressou no curso de Administração por meio do Vestibular dos Povos Indígenas e se autodeclarou indígena. O caso ocorreu no campus de Cornélio Procópio, no Norte Pioneiro.
No processo administrativo ao qual o g1 teve acesso, a jovem de 22 anos cita que começou a estudar na UENP em 11 de julho de 2022.
Duas semanas depois, diz o documento, três caciques da Terra Indígena São Jerônimo da Serra, no Norte Pioneiro, onde a aluna mora com o marido, denunciaram ao Ministério Público Federal (MPF) que ela havia sido aprovada no vestibular de forma errada, e estaria tirando a vaga de outro indígena.
Segundo a ata da reunião, um dos caciques apresentou o atestado de reconhecimento usado pela aluna no processo seletivo. O documento exigido deve ser assinado pelo cacique da comunidade e pelo candidato à vaga.
Segundo o edital do vestibular, para as vagas em universidades estaduais, o candidato também deverá comprovar que pertence a uma comunidade indígena do Paraná e a alguma etnia.
Cacique mudou de opinião
Ao MPF, cacique da etnia kaingang esclareceu que "deu o atestado de boa fé à estudante, em razão dela morar na aldeia e ser casada com um indígena".
Porém, o cacique afirmou ter mudado de opinião após verificar a origem da jovem, que veio do interior de São Paulo, e constatar que ela não é indígena.
Segundo a ata da reunião, todos os caciques reunidos declararam que a estudante não é indígena.
O procurador Raphael Otávio Bueno Santos, do MPF, e representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai) explicaram que "o critério para reconhecimento pertence aos indígenas".
'Se sente indígena'
Após a reunião, o MPF comunicou o caso à UENP, que abriu um processo interno de apuração. A comissão formada por três professores começou a trabalhar em outubro de 2022.
O grupo ouviu a estudante, o marido e a sogra dela, uma moradora da terra indígena e dois caciques que tinham se reunido com o MPF e a Funai.
À comissão, a aluna disse que se sente indígena por ser casada há quatro anos com um. "Eu fico exposta à cultura deles 24 horas por dia, convivo com eles", argumentou.
Questionada se os parentes dela são indígenas, a jovem disse que não. "Só se for bem atrás, mas de reconhecimento assim não", disse. O g1 tentou contato com a aluna, mas não obteve resposta.
Cacique não foi encontrado
No processo administrativo disciplinar, os integrantes da comissão, em reunião de 5 de dezembro, dizem que o cacique que deu o atestado de reconhecimento à estudante "não respondeu aos diversos contatos realizados para o depoimento".
Os trabalhos da comissão foram encerrados em 20 de dezembro. No relatório, os integrantes reconheceram que "o atestado de reconhecimento da estudante como indígena inicialmente existiu, mas houve a retratação desta primeira declaração".
Com base nos depoimentos, a comissão entendeu que a estudante "não agiu de má fé", mas concluiu que a jovem "não pode ser considerada indígena por não cumprir um dos requisitos necessários para o uso da política afirmativa".
A exclusão dela foi assinada pelo reitor da UENP, Fábio Antonio Néia Martini, no final de janeiro.
A UENP explicou, em nota, que o ingresso de indígenas é regido por edital próprio. A universidade diz que acata os documentos apresentados pelo candidato e que a Comissão Universidade Para os Índios faz a verificação.
A comissão é vinculada à Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SETI).
O MPF informou que "o procedimento aberto para apurar a identificação da estudante como indígena foi arquivado".
Informações Rafael Machado, G1 PR